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“Em 2021, o povo vai às ruas protestar!”

  • Postado por: Rafael Rodrigues
  • Categoria: Notícias

Entrevista com o deputado federal Paulo Ramos (PDT-RJ), parceiro dos frentistas e representante da classe trabalhadora no Congresso Nacional 

 

 – Sinpospetro-RJ – Desde 2016 os trabalhadores enfrentam um momento difícil, de arrocho e perda de direitos, agravado pela crise financeira e pela pandemia de covid-19. O que se anuncia para 2021? Vai ser outro ano difícil?

Deputado Paulo Ramos – Não há mais nenhuma dúvida de que o impeachment da presidente Dilma foi um golpe. As forças conservadoras tinham perdido quatro eleições sucessivas e tudo indicava que perderiam a eleição seguinte. Colocaram no poder o presidente Temer, que recuperou as propostas que foram derrotadas, as propostas que levaram os candidatos do presidente Fernando Henrique à derrota, desde a primeira eleição do presidente Lula. 

 

A Lava Jato teve um dirigismo. Ninguém pode ser contra a luta contra a corrupção, mas obviamente a coisa foi muito seletiva. O papel do juiz Sérgio Moro já está completamente esclarecido e desmascarado. 

 

O presidente Temer fez uma reforma trabalhista – que levou até o presidente FHC a falar em desmonte da Era Vargas – que retirou direitos dos trabalhadores. 

 

Com a manipulação do discurso moralista, o presidente Bolsonaro furou a fila, porque o golpe foi dado para colocar o candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, na vanguarda. Na última eleição da presidente Dilma, o PSDB quase elegeu o Aécio Neves. Eles acreditavam, mas a Lava Jato alcançou também o PSDB e escancarou o caminho para o presidente Jair Bolsonaro. 

 

Depois que ganhou a eleição, derrotando principalmente o PSDB, mas também o povo brasileiro, Bolsonaro assumiu as causas mais conservadoras e o desmonte do Estado. Não só fez a reforma da Previdência, retirando direitos dos trabalhadores, um horror, mas também, aproveitando-se da pandemia, aprofundou a perda de direitos para todos. 

 

O socorro só ocorreu porque era impossível, diante da pandemia, manter a proposta do teto de gastos. Só que o socorro aos empresários foi muito maior do que o socorro aos trabalhadores. 

 

Completamente desmoralizado, o governo Bolsonaro jogou as Forças Armadas em um precipício com as propostas de privatização e um modelo econômico que desmonta a soberania nacional. 

 

A eleição municipal demonstrou o fracasso e, ao mesmo tempo, que a população está assumindo a compreensão de que o governo Bolsonaro é um grande retrocesso para os trabalhadores. 

 

Sinpospetro-RJ – Agora vem a reforma administrativa…

Deputado Paulo Ramos – É a etapa final do desmonte do Estado, que terá continuidade nas privatizações. Se privatização resolvesse o problema, o Brasil já não teria nenhum problema, porque o que já foi privatizado é muito maior do que aquilo que falta privatizar. E a dívida só aumentou. 

 

Agora a dívida social está cada vez maior, o sofrimento foi agudizado pela pandemia, que alcança de forma mais contundente os mais pobres. A miséria absoluta está crescendo. 

 

A fome! Como é que o Brasil é o país da fome com esse agronegócio exitoso, maior exportador de proteína animal, maior exportador de grãos do mundo? Mas a fome está crescendo rápido, a favelização também. A concentração da renda vai ficando cada vez mais evidente, porque os ricos não perdem. São os pobres que perdem. 

 

Agora já há, pelo menos, uma conscientização na resistência democrática, porque o retrocesso do governo Bolsonaro não é apenas econômico e social, não é só a perda dos direitos e da soberania, é um retrocesso inclusive em relação aos mais elementares direitos humanos, o ódio que joga cristãos contra cristãos. 

 

Estamos no mês da Consciência Negra, em um governo que coloca na Fundação Palmares um negro que chega a negar a escravidão e a intolerância religiosa. É uma situação extremamente lamentável e difícil, principalmente para quem tem a minha idade, quem foi constituinte e lutou pelo Estado Democrático de Direito. 

 

Vamos ver no ano de 2021, porque não é mais possível aguentar, o povo ir às ruas para protestar. 

 

Sinpospetro-RJ – Por que não foi até agora?

Deputado Paulo Ramos – Porque há uma contradição com a pandemia, que exige isolamento social. Defendemos a ciência, o posicionamento dos infectologistas. Como é que vamos promover manifestações? Mas vai chegar um momento de insuportabilidade. O povo vai às ruas de qualquer maneira, acuar esse governo. Não vai demorar. 

 

Acontece esse apagão no Amapá, onde o sistema é operado por uma empresa privada, e eles prosseguem insistindo em privatizar a Eletrobras. Eles foram privatizando as linhas de transmissão contra Furnas e agora essas linhas, as mais recentes, são todas privatizadas. Aí acontece esse escândalo lá no Amapá, demonstrando o papel da agência reguladora (Aneel) como cúmplice. 

 

O pessoal lá de Brumadinho (MG) e de Mariana (MG) também foi vítima de uma empresa privada, a Vale do Rio Doce, privatizada no governo Fernando Henrique, depois que ele desmontou a Constituição, com a quebra dos monopólios, para entregar as telecomunicações, o subsolo e o petróleo. 

 

Agora as coisas estão muito evidentes. Vamos ver o que acontece em 2021, com todo esse sofrimento imposto ao povo brasileiro. 

 

Sinpospetro-RJ – E o papel dos sindicatos? Parece que o atual governo pretende fazer uma nova reforma para retirar ainda mais poder dos sindicatos. 

Deputado Paulo Ramos – Houve o desmonte da representação sindical, acabaram com o imposto sindical e proibiram o desconto em folha. Querem aniquilar os sindicatos. Acabaram com o Ministério do Trabalho, que foi subordinado ao “ministério do capital” (Ministério da Economia, no qual o que resta do antigo Ministério do Trabalho está reunido em uma simples secretaria). Essa é a representação mais evidente e mais nociva do grande capital financeiro, representante dos banqueiros. 

 

O empobrecimento da população e o sofrimento vão empurrar o povo para as ruas.    

 

Os sindicatos, que tinham recuperado a prestação de alguns serviços, agora não têm receitas. Estão precisando demitir trabalhadores, não têm mais recursos para prestar a assistência que prestavam, para mover as ações judiciais – porque antes os trabalhadores não pagavam as custas antecipadamente. Quer dizer, ele desmontaram os sindicatos e ainda obrigam os trabalhadores, caso queiram processar os patrões, a ter que pagar as custas. É a impossibilidade total. 

 

De qualquer maneira, a própria eleição municipal desacreditou o presidente da República, mesmo que a população, na eleição municipal, não tenha a compreensão do quadro nacional. A derrota dos candidatos do presidente da República, apoiados por ele, demonstra a falência do governo, mesmo que eventuais aliados tenham sido eleitos nos municípios. 

 

Vamos ver se 2021 será um ano de reação, de avanços, para derrotar esse governo em 2022. 

 

Sinpospetro-RJ – O campo progressista não tem forças para resistir no Congresso Nacional?

Deputado Paulo Ramos – O campo progressista é minoritário no Congresso, o presidente da República tem a maioria, mas a força das ruas… Vai ser uma exigência o povo ir para as ruas acuar o Congresso. 

 

Essa simulada divergência com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia… Ele é do DEM, pô! O DEM é o partido do capital, o partido do desmonte do Estado, hoje com outros partidos. 

 

O DEM que era coadjuvante, com a falência do PSDB, ocupou espaço e passou a ser o protagonista. Agora vamos ter a eleição para a presidência da Câmara. Como é que vai ficar, o DEM vai continuar presidindo a Câmara e o Senado?

 

Sinpospetro-RJ – A pandemia complica ainda mais esse quadro? Colocou em xeque a defesa do Estado mínimo?

Deputado Paulo Ramos – A pandemia colocou em xeque o capitalismo mundial. Na verdade, é o capitalismo mundial que está em crise. Temos também que enfrentar essa responsabilidade, além de resistir, denunciar, retardar ou impedir o que o bolsonarismo quer fazer, capturado que está pelo grande capital, desmoralizando as Forças Armadas. 

 

É preciso dizer isso. O presidente Bolsonaro está desmoralizando as Forças Armadas, porque aparelhou o governo com quadros e membros das Forças Armadas. Para quê? Para entregar a Petrobras, a Eletrobras e os bancos oficiais? Para entregar os Correios, a Casa da Moeda, o Serpro e o Dataprev?      

 

Os servidores públicos representam a base da resistência. Porque eles, com as garantias que ainda estão constando da Constituição de 1988, representam uma trincheira que, majoritariamente, enfrenta o governo Bolsonaro. É uma situação em que as coisas ficaram muito evidentes. 

 

Sinpospetro-RJ – O que o senhor tem a comentar sobre os últimos acontecimentos na América Latina? 

Deputado Paulo Ramos – Tivemos agora a Argentina taxando as grandes fortunas. Tivemos uma vitória na Bolívia, com o partido do Evo Morales. Temos a resistência na Venezuela, que eles não conseguiram derrubar. 

 

Há um bloqueio criminoso à Cuba, mais antigo, e agora o bloqueio à Venezuela, por causa do petróleo e das transformações que começaram com Hugo Chávez e eles querem barrar. 

 

O quadro tem grande complexidade, mas também há de se esperar que mesmo aniquilados seus direitos, os trabalhadores se mobilizem, para denunciar, exigir e pressionar. Nós temos que construir um novo governo com um novo projeto, recuperando os direitos e fortalecendo a classe trabalhadora. 

 

Porque o próprio presidente já disse, menos direitos, mais empregos. Está bem. Só que mais empregos com que salários!? Com esse salário que está aí!? Quem está empregado com carteira assinada, com exceção de um percentual muito pequeno, a maioria recebe até dois salários mínimos, pô! Quanto é que ganha um frentista, com o combustível nesse preço? 

 

Sinpospetro-RJ – No piso, pouco mais do que um salário mínimo.

Deputado Paulo Ramos – Pouco mais do que um salário mínimo. Isso quando o Brasil tem petróleo, tem refinarias, mas está importando derivados do petróleo dos Estados Unidos. O Brasil não tem necessidade de importar derivados de petróleo, as refinarias estão com capacidade ociosa. 

 

Agora vem esse escândalo lá do Amapá, com o apagão, que coloca em xeque a pretensão de privatizar a Eletrobras, a Nuclebrás. Espero que venha um movimento, partindo das Forças Armadas, do seu pessoal pedindo para sair do governo Bolsonaro, porque está confundindo a opinião pública. 

 

Sinpospetro-RJ – Sempre se disseram nacionalistas… 

Deputado Paulo Ramos – É claro. Mas, será que nem isso mais existe nas Forças Armadas? Não existe um mínimo de decência?   

 

Sinpospetro-RJ – Com o fim da contribuição obrigatória dos trabalhadores aos sindicatos, criou-se uma injustiça, na medida em que as conquistas dos sindicatos valem para toda a categoria, mas só a parcela mais consciente dos trabalhadores continua contribuindo. Como enxerga essa situação? 

Deputado Paulo Ramos – Lamentavelmente, temos que dizer isso. Algumas representações sindicais defendiam o fim do imposto, mas agora estão compreendendo o equívoco. Apostaram na militância, acharam que continuariam recebendo o imposto sindical porque são combativos, mas agora caiu todo mundo na mesma arapuca. 

 

O absurdo é tão grande que hoje o trabalhador, enquanto pessoa física, é simultaneamente pessoa jurídica, contratado como empresa. É a pejotização, na qual o patrão não recolhe encargos previdenciários. O trabalhador pode ser contratado por apenas 20 horas, por 10 horas. Se quiser ter direito à aposentadoria, vai ter que complementar o pagamento da Previdência. 

 

A tragédia dos trabalhadores no governo Bolsonaro é muito grande. Com a reforma previdenciária, aumentando o tempo de contribuição, o trabalhador vai morrer trabalhando.

 

É preciso recuperar o poder para fazer as verdadeiras reformas, restabelecendo as prerrogativas e direitos que estavam na Constituição de 1988 para os trabalhadores. 

 

Vamos lá, continuar na luta!

 

Sinpospetro-RJ – Um último recado para os frentistas? 

Deputado Paulo Ramos – Quero mandar um abraço para aos frentistas. Uma categoria com a qual sempre tive uma identidade muito grande, sempre participando dos esforços e das lutas do Sinpospetro aqui no Rio e em todo o Brasil.